Ilustração: Sizenando
É indiscutível que as organizações estejam no cerne dos debates sobre sustentabilidade, seja pelo impacto de suas ações no meio ambiente, seja pela busca da perenidade para os seus negócios.
A construção do conceito hoje denominado “sustentabilidade começou no início dos anos 1970, quando a relação entre desenvolvimento econômico e meio ambiente passou a ser discutida em fóruns internacionais. Em 1987 foi criado o Relatório Brundtland1, que trouxe a noção de desenvolvimento sustentável para a sociedade como um todo e apontou a exigência da responsabilidade intergeracional em relação ao uso dos recursos naturais do planeta. Isso significa que é imprescindível que os seres humanos atendam às suas necessidades atuais sem comprometer a possibilidade de as próximas gerações também satisfazerem suas próprias necessidades.
Esse conceito exige das empresas uma gestão que considere igualmente aspectos ambientais, sociais e econômicos na prática dos negócios. Isso inclui a redução e/ou otimização do uso de recursos naturais, minimização de impactos no decorrer de todo o ciclo de vida de produtos e processos produtivos, além da forma de tratar seus empregados e do relacionamento com fornecedores e comunidades. Pressupõe também uma conduta ética e transparente de seus dirigentes e o compromisso de contribuir para a prosperidade e desenvolvimento da sociedade como um todo. Fazer negócios nesse cenário abrangente mudou radicalmente a forma de atuar das empresas: a lucratividade exigida pelos stockholders (acionistas) precisam necessariamente atender também as necessidades de todas as partes interessadas, os chamados stakeholders2.
Num primeiro momento pode parecer que essas novas exigências inviabilizem e comprometam a atuação das empresas, mas a realidade mostra que não é bem assim. O estudo Introduction: Sustainability, Innovation and Profits feito pelo MIT Sloan Management Review e BCG -The Boston Consulting Group, com base em uma pesquisa realizada junto a executivos de companhias globais de vários segmentos, analisa como elas têm enfrentado os desafios relacionados à sustentabilidade na condução dos negócios. As conclusões mostram que em 2010 a sustentabilidade era considerada necessária para a manutenção da produtividade e, em 2011, já tinha se consolidado como um elemento permanente nas agendas e resultado em lucros para alguns deles. Em 2013, a porcentagem de pesquisados que relataram lucros advindos da sustentabilidade aumentou de 23% para 37% do total, grande parte deles gerados pela introdução de inovações que esse processo demanda.
No Brasil, a pesquisa Estado da Gestão para Sustentabilidade nas Empresas Brasileiras realizada em 2014 pelo Núcleo de Sustentabilidade da Fundação Dom Cabral, indica que há um longo caminho a ser percorrido: para os entrevistados o impacto mais relevante das ações de sustentabilidade é a valorização da sua imagem/marca (78%), à frente das melhorias nos processos (68%), inovação de produtos e serviços (66%), aumento de eficiência (63%) e redução de riscos estratégicos (55%).
Para se ter êxito no desafio de inserir a sustentabilidade nas estratégias do negócio é preciso encará-la como um valor que permeie a sua cultura organizacional.
É preciso reconhecer que, de fato, não é simples inserir a sustentabilidade nas pautas das organizações. Muitos fatores desafiam uma ampla compreensão dessa temática, a começar por características intrínsecas aos seres humanos como a de minimizar riscos, resistir a mudar suas crenças, atitudes e hábitos, tendência de enxergar apenas o que se ajusta às suas expectativas e a considerar apenas um horizonte limitado de tempo. Ou seja: o repertório humano permite enxergar o clima, as estações do ano e o seu impacto nas suas vidas, enquanto que reconhecer as mudanças climáticas, por exemplo, como uma ameaça exige uma base de conhecimento mais ampla e complexa.
Para se ter êxito no desafio de inserir a sustentabilidade nas estratégias do negócio é preciso encará-la como um valor que permeie a sua cultura organizacional. Isso demanda uma atuação sistêmica e transversal em todos os seus processos, paralelamente a um esforço contínuo de sensibilização e engajamento de todos os stakeholders envolvidos.
Em geral, as organizações têm uma política de sustentabilidade definida, muitas vezes por exigência do mercado em que atua. É fundamental assegurar-se de que essa política esteja, de fato, atrelada às estratégias do negócio e coerente com o cenário em que vivemos, onde as atividades das empresas são permanentemente monitoradas e questionadas pela sociedade. Inserir a sustentabilidade de forma estratégica traz impactos expressivos na gestão das empresas, uma vez que se trata de uma grande transformação que demanda uma abordagem estruturada para entender o cenário atual, o cenário desejado e o engajamento genuíno de todos os envolvidos.
O recurso da Gestão de Mudanças Organizacionais (GMO) é um aliado importante para ser bem-sucedido nesse desafio, uma vez que o considera um processo amplo que exige planejamento e preparação para a mudança e, posteriormente, uma atuação precisa na transição para esse novo modelo de negócios e na sua sustentação ao longo do tempo. A GMO tem também recursos específicos para monitorar e gerir o impacto das mudanças no ambiente e na cultura da empresa, no comprometimento da liderança, além da gestão das pessoas, da comunicação e do conhecimento gerado nesse processo.
Dentre as inúmeras ações a serem desenvolvidas durante a trajetória de inserção da sustentabilidade nos negócios, vale destacar as seguintes:
– Identificar a existência de práticas incoerentes com a política de sustentabilidade da empresa e, se necessário, ajustá-las.
– Analisar continuamente as demandas do desenvolvimento sustentável para identificar sinergias com o seu negócio/segmento e possíveis parcerias.
– Investir num processo de comunicação que privilegie a ‘formação’ e não apenas a ‘informação’, iniciativa que contribuirá para um esforço contínuo e eficiente para engajar líderes, funcionários e parceiros nas iniciativas de sustentabilidade.
– Promover o diálogo com stakeholders internos e externos e utilizá-lo como diretrizes para a construção das estratégias da empresa.
A gestão dos negócios a partir das demandas do desenvolvimento sustentável é um caminho cada vez mais trilhado pelas organizações e muitas delas conseguiram transformar a sustentabilidade em pilar estratégico. O desafio é grande, mas também é possível e necessário vencê-lo.
A Dynamica é especialista em estratégia, cultura e mudanças. Conte com a gente!
NOTAS
- O Relatório Brundtland foi criado pela Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento da ONU (Organização das Nações Unidas), presidia pela primeira-ministra da Noruega, Gro Harlem Brundtland. Esse relatório recomendou uma nova declaração universal de desenvolvimento sustentável e foi consolidado no livro ‘Our common future’ em 1987, sendo traduzido e editado no Brasil pela Fundação Getúlio Vargas, em 1991, com o título ‘Nosso futuro comum’.
- O termo inglês ‘stakeholder’ tem sido definido como partes interessadas em um negócio. Segundo o Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC), “Stakeholder são públicos relevantes com interesses pertinentes à empresa ou, ainda, indivíduos ou entidades que assumam algum tipo de risco, direto ou indireto, em face da empresa, como: sócios, empregados, clientes, investidores financeiros, fornecedores, credores, organizações que representem o meio ambiente, legisladores e comunidades envolvidas, direta ou indiretamente, com as atividades da empresa. Estão incluídas as partes afetadas pela empresa que não estão organizadas e não são capazes de ser engajadas, como o meio ambiente, outros seres vivos, crianças, gerações futuras etc”.
REFERÊNCIAS
ALMEIDA, Fernando. Os desafios da sustentabilidade: uma ruptura urgente, 2007 KIRON. MIT Sloan Management Review e BCG -The Boston Consulting Group, 2013 KRUGLIANSKAS, Isak; PINSKY, Vanessa Cuzziol, (Org.) Gestão estratégica da sustentabilidade: experiências brasileiras, 2014.KUNSCH, Margarida M. Krohling. A comunicação para a sustentabilidade das organizações na sociedade global. KUNSCH, Margarida Maria Krohling (Org.). A comunicação na gestão da sustentabilidade nas organizações. São Caetano do Sul, SP: Difusão Editora, 2009.LAURIANO, L.A; BUENO, J.H; SPITZECK, H. Núcleo de Sustentabilidade, Fundação Dom Cabral. Estado da Gestão para Sustentabilidade nas Empresas Brasileiras, 2014 MARCONDES, Adalberto Wodianer; BACARJI, Celso Dobes. ISE – Sustentabilidade no mercado de capitais, 2010. MATIAS, Eduardo Felipe P. A humanidade contra as cordas: a luta da sociedade global pela sustentabilidade. São Paulo. Paz e Terra, 2014.MCNAIL, S.; BASILE, G. How to create a new narrative for sustainability that will work: and why it matters. Sustainability: the journal of record v.6, n.6, 2013. p 297-301O QUE É STAKEHOLDER. http://projetodraft.com/verbete-draft-o-que-e-stakeholder/
(*) Maria Aparecida Prazeres Napoli, profissional da área de comunicação corporativa. Pós-graduada em Gestão estratégica da comunicação organizacional e relações públicas pela Universidade de São Paulo (USP).